Safo, a poetisa grega, dizia: “O homem belo só o é quando o contemplam, mas o homem sábio é belo mesmo quando ninguém o vê.”
Ao lê-la, tantos séculos depois, penso nas máscaras, nas personagens que nos tapam a alma.
Esse "homem belo" de que fala Safo lembra-me a estrutura narcisista... aquele que diariamente é o que não é, belo porque em pose, belo porque em sedução e manipulação, belo porque em mentira... e é isto que o alimenta, não à alma, mas ao Ego... ao ego e a essa tremenda ferida narcísica que leva dentro e que tenta ocultar a todo o custo (quantas vezes demasiado elevado!).
(Imagem: Eco e Narciso by John William Waterhouse)
O "homem belo" precisa de palco para brilhar, do alimento narcísico constante, da adulação (mesmo que falsa)... precisa que o contemplem, que lhe confirmem que existe! A relação torna-se meramente funcional, longe dos afectos e do coração.
(Imagem: Aspasie no meio dos Filósofos da Grécia by Michel II Corneille)
Já o "homem sábio" de Safo, me recorda o homem consciente... aquele que aceita a sombra, que não se renega... que é genuíno à luz do dia e na escuridão solitária da noite... que se atreve a caminhar no seu ser... que se lança no caminho iniciático de integração dos seus opostos e de resgate da sua alma... que abre a porta ao sentir e à verdade.
O "homem belo", ao contrário, encontra-se clivado, engana-se e engana na vã glória que constitui a negação da sua sombra, esquecendo que a sua sombra o persegue na sua defesa contra a mesma... ou seja, plasma-se sem dó nem piedade na manipulação alheia. E esquece-se de quem é, porque a máscara acaba por se lhe colar à pele e a vida decorre em automatismos ritualizados.
Há séculos que Safo intuiu esta dor feita drama... a qual se mantém nos dias de hoje amiúde... demasiado amiúde!
lúcia*