aprisionada no campo magnético do medo, sentia as dores crónicas no corpo e na alma...
tolhida, procurava toda a sorte de mezinhas medicinais, que achava poderem coadjuvar os químicos farmacêuticos que coleccionava num armário da cozinha, todos prescritos por especialistas médicos escolhidos a dedo ou recomendados por amigas que sofriam do mesmo mal...
há muito que se resignara à sua cruz, da qual fazia porta estandarte quando, às quintas-feiras, se reunia com as companheiras de tormentos mil, num desfiar de rosários dolorosos...
mal se escutavam, pois o falar pessoal era monólogo conjunto, em meios dos bolinhos, scones e do tilintar metálico das colheres com açúcar mascavado rodando ritmadamente nas chávenas de porcelana fina.
um dia, por aparente acaso, aproximou-se de si uma menina de olhar profundo, ao mesmo tempo doce e brilhante, caracóis alvos e suaves a descerem pelas costas...
tocou-lhe no braço ao de leve, mas o toque fê-la estremecer, roubando-a ao seu crónico torpor...
olharam-se nos olhos, enquanto os monólogos das amigas pareciam perder o som e o tempo ficar em suspenso...
e filmes de outrora surgiram naquele olhar inocente que a fixava... ela de novo, com os seus próprios caracóis despreocupados ao sol do Verão da infância... em casa da avó materna...
levantou-se, deixando-se levar, confiante e sem medo...
e afastaram-se de mãos dadas... caminhando... sem vestígio de qualquer dor!
lúcia*

Simplesmente lindo....
ResponderEliminarGrata! :)
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